Não posso colocar estes três filmes de que vos vou falar hoje no mesmo patamar que os outros. Estes são os filmes que mais me marcaram. São também os filmes que menos tento ver. São tristes e poderosos. Não tem qualquer ordem de preferência porque não consigo mesmo escolher. Acho que são todos maravilhosos.
Girl, Interrupted (Vida interrompida) - 1999
O filme desenrola-se no final dos anos '60. Susanna (Winona Ryder) é internada num hospital psiquiátrico depois de ter tomado 50 aspirinas com uma garrafa de vodka. Susanna não se adequava à sociedade, não se encontrava a si própria. Não sabia o que queria nem tinha objectivos. No hospital psiquiátrico conhece a sexy Lisa (Angelina Jolie), que a fascina pois representa liberdade. As duas constroem uma relação complexa. Lisa é uma sociopata, com tanto de cruel como de vulnerável. Susanna é diagnosticada como vítima da síndrome de Borderline.
Ao longo do filme, vão sendo destacadas outras doenças como a anorexia noutras personagens. Todas têm um bocado de loucura. O filme incide precisamente na loucura - será a loucura uma característica inata? Susanna descreve-a como sendo uma amplificação de nós próprios, dos nossos desejos e vontades.
O filme também reflecte sobre a necessidade que nos impõe de pertencer à sociedade e de nos adequarmos a ela. Susanna é internada porque não consegue encaixar-se na sociedade, era uma outsider que não tinha objectivos ou ideias do que fazer da sua vida e que só via a solução na morte.
Há uma atmosfera de tristeza durante todo o filme. Todas as personagens são loucas, são tristes, são postas de parte pela sociedade que acha que a melhor forma de as tornar melhores cidadãs é interná-las num hospital psiquiátrico.
As frases são quase todas memoráveis e dignas de reflexões que podem durar horas - ou a vida inteira. As personagens estão muito bem desenvolvidas e interpretadas. Neste ponto não posso deixar de referir que Winona Ryder está magnificamente bem, mas Angelina Jolie ultrapassa-se e tem em Lisa a melhor interpretação da sua vida (que lhe valeu o Óscar de Melhor Actriz Secundária) e deixa-me a perguntar porque é que deixou de fazer interpretações destas em que dá alma e corpo à personagem. Do elenco fazem ainda parte, entre outros, Brittany Murphy, Whoopi Goldberg, Clea DuVall e Jared Leto.
Baseado no livro de Susanna Kaysen e dirigido por James Mangold, este é um filme que vale a pena ver e rever e voltar a rever imensas vezes. Atinge-nos como uma pedra e sem dúvida que nos faz questionar sobre nós próprios, os nossos objectivos, os nossos ideais e a nossa própria loucura!
American History X (América Proibida) - 1998
Visualmente e psicologicamente violento. O filme é narrado por Danny Vinyard (Edward Furlong) através de flashbacks (que são representados a preto e branco, enquanto que as cenas no presente são a cores). Danny começa por nos contar como é que o seu irmão mais velho, Derek Vinyard (Edward Norton), foi preso (através de uma cena violentamente inesquecível).
Antes de ser preso, Derek era o líder de um grupo de skinheads neo-nazis que acreditava piamente na superioridade da raça branca. Este ódio pela raça negra é despoletado quando o seu pai morre num bairro habitado por pessoas de raça negra. É apaixonado a defender aquilo em que acredita, tão apaixonado quanto violento.
Danny tenta seguir os seus passos, integrando-se no antigo grupo de Derek. Quando o seu irmão mais velho sai da cadeia, apercebe-se, através de um trabalho que Danny entregou na escola sobre o "Mein Kampf" de Adolf Hitler. Os ideais radicais presentes no trabalho chamam a atenção do director da escola que se sente na obrigação de informar a família de que algo não está bem com Danny.
O tema retratado neste filme é um tema já muito explorado e que podia facilmente cair em cliché. A melhor parte está aí: não cai em nenhum tipo de cliché. É um filme duro mas que nos deixa escolher que lado queremos apoiar: o filme é, de certa forma, a narração de um texto escrito por Danny.
Edward Norton interpreta de forma magistral a sua personagem (o que lhe valeu uma nomeação para o Óscar de Melhor Actor), assim como Edward Furlong. É impossível imaginar o filme com outros protagonistas.
Acho sinceramente que este filme devia ser mostrado nas escolas no último ano do secundário (devido às cenas de sexo e à linguagem obscena). Derek é um magnífico orador que consegue convencer toda a gente que sente necessidade de se inserir a um grupo a inserir-se no seu. Depois de ser libertado, torna-se numa pessoa completamente diferente e com uma visão mais clara do mundo e que tudo o que quer é manter o seu irmão a salvo dos erros que ele próprio cometeu.
Dirigido por Tony Kaye (e é em American History X que se estreia como director) e escrito por David McKenna, é daqueles filmes que toda a gente devia ver pelo menos uma vez na vida.
Requiem for a Dream (A vida não é um sonho) - 2000
Baseado no novel de Hubert Selby Jr. e dirigido por Darren Aronofsky, é uma obra-de-arte psicológica. É o filme mais triste que já vi. O meu filme preferido e que não quero voltar a ver. Vi-o à cerca de um ano e meio pela primeira vez e fiquei num estado de coma cinematográfico por cerca de um mês, e quem me conhece sabe que raramente passo uma semana sem ver um único filme.
Este filme retrata a negação da realidade de quatro personagens - Harry Goldfarb (Jared Leto), Sara Goldfarb (Ellen Burstyn), Marion Silver (Jennifer Conelly) e Tyrone Love (Marlon Wayans). Estas quatro pessoas preferem viver nos seus sonhos e naquilo que idealizam para si do que viver na realidade. Esta forma de vida que escolhem vai, aos poucos, destruí-los. Durante o percurso, todos perdem alguma coisa, mas sobretudo todos perdem os seus sonhos.
Acho que não consigo captar a intensidade deste filme. Este filme é sobre abuso de drogas mas não só. É, mais do que isso, sobre a natureza do vício e o que isso pode fazer às pessoas.
É dirigido de forma única, como nunca vi em nenhum filme (e eu já vi muitos, tenho de confessar): o ecrã que se divide em dois, os zooms, os planos rodopiantes, as cenas em slow e fast motion, tudo tão magistralmente bem retratado. Depois a banda sonora de Clint Mansell que é tão sombria quanto o filme e se encaixa na perfeição. E a fotografia de Matthew Libatique, que também merece destaque.
O filme é, também de forma original, dividido em estações do ano. Começa no Verão, onde os planos ainda são coloridos e onde as personagens ainda conseguem controlar a sua vida. Depois passa para o Outono e para o Inverno e as personagens entram numa espiral de vício e de descontrolo total. São apenas retratadas 3 estações. Deixando no final (final arrebatador, que nos deixa completamente destroçados e em estado de hipnose total), quando todas as personagens se encontram em agonia e sofrimento elevado ao expoente máximo e ficam em posição fetal, uma esperança (ou não) de Primavera e de renascimento.
Este filme é tão arrebatador, tão difícil, tão sombrio, tão hipnótico e electrizante. Esta é a obra-prima da minha vida. Tenho a certeza que não verei nunca outro filme tão arrebatador como este, que retrate de forma tão crua o pior da condição humana. Este filme é arte. Conjuga tudo aquilo que um filme precisa para ser magnífico. E é verdadeiramente magnífico. É poderoso, e deixa-nos submissos. Poderia ficar horas a dissertar sobre este filme, para mim é genial. Em todos os aspectos. É genial e é inesquecível (pode gostar-se ou não dele, mas é inesquecível).