terça-feira, 5 de abril de 2016

A hora de redefinir prioridades

Foto: O Lado V
Falar do jogo contra o Boavista era, em boa verdade, estar a repetir-me. O Vitória continua a cometer erros, a assinar exibições pouco agradáveis e a afastar-se dos lugares europeus. Conseguimos um ponto, e sempre me disseram que um é melhor do que nenhum, mas que pouco ajuda ao único "objectivo" que nos resta, quando andamos há muitas jornadas a contar pontos. Não gosto, nem nunca gostei, de jogar para cumprir calendário. É jogar a um ritmo morno, assim-assim. É jogar num estado vegetativo. De vez em quando há alguns sinais que indicam para uma melhoria, mas estamos muito longe da recuperação e de estarmos em forma. Este estado vegetativo foi praticamente auto-induzido diga-se. Acho que já todos concluímos qual a raiz do problema: a época muito mal preparada (e como um problema nunca vem só, surgiram mais uns quantos para agravar a situação).

Portanto é pertinente, sem querer "atirar a toalha ao chão", começar a pensar na próxima época e nos objectivos reais a serem propostos para a equipa. Objectivos esses que têm de honrar a nossa história, e a nossa história é de lutar sempre por mais e pelo melhor, não para ficar pelo meio termo. Os objectivos do Vitória no campeonato devem ser sempre, no mínimo, o 4º lugar da tabela classificativa. Quanto mais para cima, melhor. Para além do campeonato, o objectivo tem de ser também o de chegar o mais longe possível (e por isto entenda-se ganhar) todas as restantes competições em que se envolver. Não estou a pedir de mais, o nosso nome e o nosso cognome não engana.

O que não pode acontecer é ter ambições e aspirações sem que haja uma maior aposta na vertente desportiva do que a que houve nesta e nas últimas épocas. Não estou a dizer que quero uma equipa de milhões e coisas assim. Não me importo de ver jogar uma equipa "de tostões" desde que tenha qualidade e nos faça alcançar os nossos objectivos. O que quero ver é uma equipa capaz de levar o Vitória ao lugar onde pertence. Se essa equipa é de 5, 10, 30 ou 50 milhões diz-me pouco. Johan Cruyff disse que nunca viu um saco de dinheiro marcar um golo, e eu também não. Portanto acredito que se possa fazer muito com pouco - aliás, já vi o Vitória fazer muito com pouco. Fazer muito "com pouco" passa, por exemplo, pela aposta no jogador vitoriano, formado aqui e deixar de fora as apostas nos jogadores do clube x e/ou y. O nosso historial não mente: o jogador vitoriano tem qualidade. Fazer muito "com pouco" também passa por manter o que de melhor temos desta época - e eu acredito que temos um plantel com boas individualidades, apesar do baixo rendimento do colectivo - e não vender a preço de saldo (e sim, dois milhões é preço de saldo) como se tem feito demasiadas vezes. Quiçá se alguns jogadores não tivessem saído ao desbarato como saíram a equipa não estava numa posição muito mais confortável.

Julgo que o Vitória deve adoptar uma máxima para a próxima época (e para as vindouras) que se resume a uma palavra: balanço. Um balanço entre a vertente financeira e a vertente desportiva. Por falta de balanço de direcções anteriores (falta de balanço e outras coisas diria eu, mas isso é tema para outra discussão), o Vitória foi obrigado a fazer vários esforços para se manter à tona - um deles sendo um menor investimento no futebol. Acho que todos, ou a maioria, compreendemos que foi necessário fazê-lo e pelo que nos é dado a saber o estado financeiro do clube tem apresentado melhorias. O problema é que o balanço tem de ser reposto, eventualmente. O tempo para o fazer parece-me ser quando a sua falta começa a ser evidente. Eu diria que estar a lutar (com dificuldades) pelo sexto lugar e disputar o campeonato com o Paços de Ferreira ou Estoril (com todo o respeito) é um sinal bastante evidente e alarmante de que está mais do que na hora de redefinir prioridades.

Vou apresentar-vos um exemplo para ilustrar aquilo que quero dizer com a ideia de balanço. O último livro que li faz referência à necessidade de haver um balanço entre os vários departamentos de uma empresa, no caso em particular da Pixar. Não preciso de dizer que o Vitória e a Pixar têm naturezas totalmente diferentes, mas apesar das diferenças abismais aos mais variados níveis têm, pelo menos, uma coisa em comum: ambas precisam de balanço. A Pixar é composta por vários departamentos. Desde o departamento financeiro, o departamento tecnológico, passando pelos departamentos de produção, marketing, entre outros. Todos esses departamentos, como necessidades díspares, se envolvem em todos os projectos, em todos os filmes. Cada departamento está concentrado nas suas próprias necessidades (por exemplo, o departamento financeiro quer manter-se dentro dos limites do orçamento mas o departamento tecnológico quer tecnologia de ponta para fazer sempre o melhor filme possível, só que isso tem, geralmente, custos elevados e interfere nas necessidades do departamento financeiro) sem ter uma visão clara do todo. O que o presidente da Pixar nos diz é que numa cultura saudável os departamentos reconhecem a importância de balancear as necessidades de todos os departamentos - a noção já antiga de que o todo é maior do que a soma das partes. Ou seja, todas as necessidades têm de ser ouvidas mas nenhum departamento pode ganhar aos outros - para que o maior vencedor seja a empresa, o todo. A frase que Ed Catmull usa, e que eu acho que se aplica é: If any of those groups 'wins', we lose. Resumidamente, balanço!

O que eu quero dizer, de forma simplificada, é que o balanço entre as duas vertentes, desportiva e financeira, pode ser o caminho para o Vitória voltar ao lugar que lhe pertence por direito que é o de lutar pelo cimo da tabela e ambicionar sempre um bocadinho mais. Portanto talvez esteja na hora de redefinir prioridades e voltar a conquistar muito mais, com uma aposta no que é nosso e no que tem qualidade, com grandes objectivos sem nunca descurar a vertente financeira. Temos tudo para o fazer, começando pela massa associativa sem comparação que merece mais do que o meio da tabela.

Para terminar vou só fazer referência ao que ouvi, na Rádio Santiago, no final do jogo e achei que fazia todo o sentido. O comentador disse qualquer coisa como: apesar de os adeptos estarem sempre presentes necessitam de um estímulo maior, de um objectivo real e concreto (que nos falta agora). Seja esse estímulo para apoiar a equipa quando ela está a lutar pelos lugares cimeiros da tabela e para a manter lá ou para a amparar e segurar quando ela está a lutar pela manutenção. Ter um objectivo faz com que os vitorianos se mobilizem ainda mais. A assistência do jogo de sábado chegou quase a 10 000 espectadores. Uma assistência boa para a grande maioria dos estádios portugueses, mas convenhamos que não é satisfatória num jogo destes. Não para nós!

Não sei se vamos cumprir o único "objectivo" que nos resta. Quero acreditar que sim, algo que nos salve desta agonia. Há duas coisas que me fazem acreditar que sim: o querer dos vitorianos (eu incluída) que é muito forte e já foi capaz de levar o Vitória literalmente mais longe e a garra que vejo na maioria dos jogadores. Enquanto for matematicamente possível e eu vir estas duas coisas, eu vou acreditar até ao fim e, escusado será dizer, vou estar sempre presente, sejam quais forem as circunstâncias. Como estou sempre, e como todos os vitorianos estão sempre. É por isso que somos únicos!

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