terça-feira, 3 de setembro de 2013

2 milhões de refugiados

Há uma teoria que afirma que já alguém disse aquilo que queremos dizer, é por essa frase que vou começar este post:

"Consideram a guerra necessária? Muito bem. Enviem aqueles que apregoam a guerra numa legião especial de vanguarda - ao ataque, à frente de todos os outros" - Alphonse Karr

Há realidades que me chocam, que fazem com que o meu coração fique muito apertado. A realidade na Síria faz isso comigo neste momento, faz-me sentir impotente, fraca, produto da sociedade de merda em que vivemos. A verdade é que eu estou aqui sentada, a escrever não sei para quem, num computador caro, com um telemóvel caro, um relógio caro sem fazer nada para melhorar o mundo. A verdade também é que todos vocês fazem o mesmo. Somos todos culpados mas não somos nós quem arca com as consequências.

São eles. Eles que também tinham uma família, uma casa, um pai e uma mãe. Eles que tinham um irmão que adoravam e uma  vida em que eram felizes. Eles que tinham talvez até um cão que dormisse com eles porque gostavam tanto do cachorrinho que não o queriam largar. Eles tinham isso tudo, tinham menos que nós e eram felizes. Provavelmente enquanto nós passamos a vida agarrados a um computador eles estavam a provar a vida de verdade, a jogar à bola descalços com os amigos que iam ser para a vida. Eles tinham um companheiro, um marido, um namorado ou uma namorada que amavam e por quem davam a vida.

A maioria de nós vê a vida desmoronar-se aos bocados: hoje perdemos o emprego ou falhamos num teste, para o próximo mês pedimos o divórcio, daqui a meio ano morre-nos o cão... Vemos a vida desmoronar-se hoje e amanhã e pelo meio dizemos que somos uns desgraçados e que tudo nos acontece tão rápido que nem é culpa nossa realmente, é culpa da puta da vida. Essa vaca que faz com que o nosso smartphone caia ao chão e se parta em pedaços. Desgraçados que somos! Agora vamos ter de gastar mais 700€ noutro, injustiça!

Mas aqueles dois milhões viram tudo ser-lhes tirado em pouco tempo para sofrerem por muito tempo. Uma vida inteira, aqueles que têm direito a vivê-la. E os que têm esse privilégio (?) ficam sem nada. Não é sem o smartphone topo de gama ou sem as sapatilhas da Nike que são o último grito. Tenho a certeza que eles preferiam que assim fosse. Mas não, não é assim. Tiram-lhes o que de mais valioso se pode ter na vida: a família, os amigos e o amor. É com isso que eles sofrem.

Muitos viram a mãe a ser morta, tiveram o pai e o irmão a morrer-lhes nos braços. Outros viram os filhos morrer, esses que deviam ter uma vida pela frente. Viram ainda o marido a suspirar pela última vez, com quem casaram por amor. Deixaram de viver naqueles momentos. E creio que a maioria não vai recuperar a essência da vida. Mesmo que o coração bata, só existem, são só corpos com cicatrizes irreversíveis, com as memórias mais horríveis que possamos imaginar.

E agora é tempo de eu fazer uma pergunta, só uma a que provavelmente ninguém me vai dar resposta algum dia: tudo isto é em nome de quê?

Não sei em nome de que é que se destroem vidas, lares e famílias com tanta frieza e naturalidade. Como se fosse a lei da natureza, como se a guerra fosse necessária para fazer paz. Só gostava que esses filhos da puta sem coração que acham que sim, que apregoam a guerra, que a defendem pensassem nas respectivas famílias: pensem na mulher ou no homem que vos está a fazer o jantar em casa, nos vossos filhos que vos chamam para brincar, nos vossos irmãos que são companheiros na vida e em tudo, nos vossos pais que sempre vos trataram com carinho e amor e vos deram tudo sem pedir nada em troca, nos vossos amigos de jantares e de festas. Pensem neles todos, que fazem parte da boa parte da vossa vida. E façam a pergunta a vocês próprios: e se fossem eles? Aqueles que odeiam toda a espécie humana e apregoam a guerra, o uso de armas químicas, que querem destruir o mundo, atirem-se ao rio, ingiram 10 frascos de comprimidos. Ninguém quer saber disso realmente.

É por situações como estas que eu quero fazer voluntariado em países desfavorecidos como é o caso da Síria, em que o terror e o medo é o dia-a-dia daquelas crianças, daquelas mulheres e homens que não fizeram nada para que lhes destruam o mundo. É por isso, com a esperança de que talvez eu possa fazer sorrir um daqueles refugiados, com a esperança de que talvez um dia possam esquecer nem que seja por uma ténue fracção de segundos tudo o resto e sejam felizes, que esqueçam o medo, o sangue, o terror, o sofrimento e se limitem a ser felizes, a sorrir, a viver.

Todos temos o direito à vida. Todos somos seres humanos, todos temos um coração, um cérebro, um corpo. Todos merecemos viver livres. E ninguém, mas ninguém mesmo tem o direito e o poder de destruir vidas assim, destruir vidas de milhões de pessoas.

E nós temos o dever de ajudar. O dever de ajudar dois milhões de pessoas. O dever de fazer deste mundo um lugar mais agradável. Talvez não possamos parar a guerra, talvez não tenhamos metralhadoras, tanques de guerra, armas químicas, aviões e granadas. Não, nós não temos nada disso porque isso nem é preciso. Mas temos uma coisa muito importante: carácter. E também porque vivemos num mundo em que temos o direito de nos exprimirmos, temos o direito (e dever) de levantar a nossa voz para poder mudar o mundo. Se não for mais, o mundo daqueles dois milhões de pessoas e o mundo de todas aquelas que passam por algo semelhante e que têm o sofrimento como pano de fundo da sua vida. 






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