segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Sétima Arte | Birdman or (The Unexpected Virtue of Ignorance)

A noite de Óscares foi noite de empate mas Birdman foi o vencedor. Para ser mais clara, Birdman e The Grand Budapest Hotel tinham 9 nomeações cada um; e cada um arrecadou 4 estatuetas douradas. Porque é que Birdman foi o vencedor? Ganhou nas categorias mais importantes: melhor filme e melhor realizador (Alejandro González Iñarritu), para além de melhor argumento original (por Alejandro González Iñarritu, Nicolas Giacobone, Alexander Dinelaris e Armando Bo) e melhor fotografia (que ficou a cabo de Emmanuel Lubezki, que já conta com 7 nomeações no currículo e venceu o ano passado com Gravity).
Quanto a mim, eu tenho sentimentos extremamente antagónicos em relação a este filme; se por um lado acho que tem pontos brilhantes e um elenco muito sólido e extremamente bom, por outro sinto que não me consegui sintonizar com o filme na sua totalidade.
O filme é dirigido como se fosse uma peça de teatro, com poucas interrupções. A narração ocorre enquanto deambulamos com as personagens pelos corredores do teatro. É esse estilo que, para mim, faz com que Birdman se distinga de um filme normal.
Riggan (Michael Keaton) é um actor assombrado pela grandiosidade de Birdman, o herói que interpretou à 20 anos e que lhe deu prestígio, antes de entrar numa fase decadente. No entanto, Riggan tenta reerguer-se no teatro - porque o teatro dá prestígio - ao escrever, encenar e actuar numa peça. Esta peça serve não só para se reerguer mas também para calar a voz que o assombra: a voz de Birdman, ele próprio mas muitos anos antes. Para que a peça funcione é necessário que seja protagonizada por bons actores, é aqui que entra Mike (Edward Norton). Mike é o menino querido da Broadway, o preferido da crítica e chega com um método revolucionário para fazer com que a peça resulte. Mas aparentemente esse método pode desviar os holofotes de Riggan; que agora para além de ter de lutar contra si próprio, tem de lutar também contra Mike para ser divinizado pela crítica e assim reconstruir a sua carreira sob bases firmes, porque caso seja contestado pela crítica pode ser o fim da sua carreira!
Michael Keaton e Edward Norton desempenham muito bem os seus papéis e sem dúvida que mereceram as nomeações (não ganharam por mérito dos outros nomeados, nunca por desmérito deles). Um facto curioso é que a ficção mistura-se com a realidade: Michael Keaton não interpretava um personagem de forma tão magistral e tão importante desde 1992, momento em que a sua carreira entrou em decadência; tem em Riggan o papel para recuperar os golden days da sua carreira - um bocadinho como o seu personagem. Emma Stone também se destaca no papel de Sam, a filha desequilibrada e carente de Riggan que sai da reabilitação. A miúda tem muita pinta e talento e uma interpretação positiva. Os actores tiveram uma dificuldade acrescida: o facto de as cenas serem sequenciais, de raramente haver cortes (ou se os há Alejandro torna-os invisíveis) dificulta o trabalho do actor.
Este filme é uma crítica. Uma crítica a Hollywood, uma crítica à indústria do entretenimento de forma global. E mais uma vez, centra-se na necessidade humana pela grandiosidade, pelas palmas quando as cortinas baixam, pela necessidade de sermos grandes e de sermos reconhecidos. Levanta questões importantes: Riggan e Mike fazem-no pela arte como o afirmam ou fazem-no por satisfação própria, para se tornarem imortais, pela fama? É uma sátira também aos críticos que julgam e desvalorizam os actores consagrados antes mesmo de ver o seu trabalho.
Concluindo, eu gostei da experiência de ver Birdman no nível técnico. A fotografia e a realização são brilhantes, são outside the box, são muito peculiares e eu adoro novas experiências. Birdman é, sem qualquer dúvida, uma incrível experiência cinematográfica. No entanto, não consegui criar nenhuma ligação emocional com o filme, não consegui sintonizar-me. Por isso digo que é antagónico: se por um lado gostei da parte técnica e da novidade e da ousadia, deixou a desejar em tudo o resto. E geralmente, eu valorizo "tudo o resto" um bocadinho mais.

P.S.: Fiquei muito contente por ver Alejandro levar o Óscar de Melhor Realizador, é o segundo mexicano da história a vencer o Óscar (o primeiro foi Alfonso Cuáron, o ano passado, com Gravity). Merece por ter sido arrojado e ter apresentado um trabalho consistente enquanto realizador e um trabalho inegavelmente bom. Mas não dava o Óscar de Melhor Filme a Birdman exactamente pelo que já disse: distingue-se principalmente pela forma como é filmado, pela montagem e pela fotografia (3 dos 4 óscares que ganhou) mas, apesar do elenco magnífico, não consegui criar empatia pelas personagens ou pelo filme em si. Foi um problema exclusivamente meu?

P.S. 2: Certamente já perceberam que o filme tem um segundo título: The Unexpected Virtue of Ignorance. Eu questionei-me imediatamente o porquê de ter um segundo título e tentei pesquisar. Não encontrei nenhuma explicação vinda directamente de Alejandro e portanto cada um pode interpretar como quiser esse acrescento; há quem defenda que é devido à crítica que Tabitha Dickinson faz da peça de teatro de Riggins. Trocando isto por miúdos: Riggins não pertence ao teatro, é um amador e para ela as características de um actor de cinema não são as cacterísticas ideiais para quem pretende trabalhar no teatro. Tabitha já viu muito teatro que não respeita as normas e a maioria foi uma má experiência. No entanto, Riggins surpreende-a e apresenta um trabalho agradável e consistente; é a inesperada virtude da ignorância.




As minhas apostas - Óscares 2015

Estou muito curiosa para saber qual o destino das estatuetas porque não estou segura em nenhuma categoria como estava seguríssima o ano passado de que o 12 Years a Slave ia levar para casa a estatueta mais importante da noite. Os nomeados este ano caracterizam-se pelo baixo orçamento, o que para mim é um óptimo sinal; assim como saber que dos oito nomeados na categoria de Melhor Filme, 7 são independentes (apenas American Sniper, de Clint Eastwood, é de um grande estúdio).
Quero deixar-vos a minha opinião de quem acho que vai ganhar e quero deixar-vos também a minha preferência. Portanto, vou tentar fazer isto de forma simples: indico a categoria e deixo o nome do filme que acho que vai ganhar; entre parênteses fica a minha opinião. Se não perceberem, não se preocupem muito com o assunto que para o ano há mais está bom??

Melhor Filme: Boyhood (Whiplash)

 
Porquê? Boyhood venceu nos Golden Globes, no Critics Choice e nos BAFTA e é filme mais querido do ano. Entendo as razões e estou ansiosa por ver este filme. No início achei que este prémio ia para American Sniper porque é o filme que a Academia adora e os americanos, em geral, adoram; faz deles heróis. Agora acho que se vai disputar a estatueta com alguém será com Birdman. Gostava que o vencedor fosse Whiplash pelas razões enumeradas no post anterior.

Melhor Realizador: Richard Linklater - Boyhood
Porquê?  Tal como na estatueta de Melhor Filme acho que este pode ser disputado entre Linklater e o realizador de Birdman - Alejandro González Iñárritu. Não tenho nenhuma preferência nesta categoria e só vi 2 dos 5 nomeados. No entanto apostaria em Linklater pelo seu projecto ambicioso de 12 anos e penso que é por essa mesma razão que a Academia irá entregar-lhe o prémio.

Melhor Actriz: Julianne Moore - Still Alice (Rosamund Pike - Gone Girl)
  Porquê? Mais uma vez vou pela opinião comum de que Julianne Moore vai ganhar com o seu papel em Still Alice e também porque saiu vencedora de todas as cerimónias que precederam os Óscares. No entanto estou a torcer para que a estatueta vá com Rosamund Pike em Gone Girl que interpreta magistralmente o seu papel; o filme é dela!

Melhor Actor: Eddie Redmayne - The Theory of Everything (Eddie Redmayne - The Theory of Everything)
Porquê? Para todos aqueles que viram o filme é fácil perceber porque acho que ele vai vencer e porque quero que ele vença. Não tenho mais comentários a fazer nesta categoria. Desempenho perfeito!

Melhor Actriz Secundária: Patricia Arquette - Boyhood
Porquê? Para ser sincera nenhum desempenho das actrizes nomeadas nesta categoria me fez querer dar-lhes um Óscar, não há nenhuma interpretação que me tivesse ficado na memória. Estiveram todas bem, só bem. Nada de extraordinário. Ainda assim vou pela opinião comum e acho que Patricia Arquette vai levar a estatueta.

Melhor Actor Secundário: J.K. Simmons - Whiplash (J.K. Simmons - Whiplash)
Porquê? Uma prestação intensa e muito boa de J.K. Simmons e por isso acho que o Óscar não pode ser entregue a mais ninguém. No entanto dava uma menção honrosa ao "meu querido" Edward Norton!

Melhor Argumento Adaptado: The Imitation Game por Graham Moore; Whiplash por Damien Chazelle
Porquê? É a categoria que me suscita mais dúvidas e fica bem entregue a qualquer um dos dois, no entanto a minha preferência pende ligeiramente para Whiplash; mas acho que será The Imitation Game a sair vencedor.

Melhor Argumento Original: Birdman por Alejandro G Iñarritu, Nicolas Giacobone, Alexander Dinelaris, Armando Bo; The Grand Budapest Hotel por Wes Anderson, Dan Futterman
Porquê? Não tenho preferências porque só vi um dos filmes nomeados para esta categoria. Acho que o prémio estará dividido entre estes dois filmes porque Birdman saiu vencedor nos Golden Globes e nos Critic Choice, enquanto que The Grand Budapest Hotel levou a melhor nos BAFTA e nos WGA. Se tivesse de apostar só num, apostava em Birdman.

Melhor Edição: Boyhood (Whiplash)
Porquê? As pessoas têm aclamado Boyhood pela capacidade de compactar as imagens gravadas durante 12 anos, no entanto a edição de Whiplash está verdadeiramente magistral, surpreendente e diferente. Não vi Boyhood mas daria o prémio a Whiplash.

As minhas apostas estão feitas e os Óscares estão precisamente a começar neste momento. É provável que não acompanhe a cerimónia toda porque termina por volta das 5 horas da manhã, mas certamente irei revê-la noutro dia. Boa segunda-feira para vocês!

domingo, 22 de fevereiro de 2015

Sétima Arte | Whiplash

Dos oito filmes nomeados para a categoria principal na cerimónia dos Óscares já só me falta ver dois: BoyhoodThe Grand Budapest Hotel. A cerimónia é já daqui a algumas horas e eu tinha a ambição de ainda ver estes dois filmes que faltam e escrever sobre todos eles no blogue antes da cerimónia. No entanto e apesar de não parecer eu tenho uma vida para além de ver filmes (e gripe, também tenho gripe) portanto esta ambição não dá para mais nada do que um bom guião para Mission: Impossible 6. No entanto, venho aqui deixar as minhas apostas!
O menos conhecido dos nomeados é provavelmente Whiplash e admito que também me poderia passar despercebido se não fosse esta nomeação, mas era um verdadeiro desperdício até porque junta duas das melhores coisas da vida: música e cinema. Para além de ser o menos conhecido, é também o mais diverso e "a lufada de ar fresco" entre todos eles porque é muito diferente e ao mesmo tempo muito agradável. É o género de filme que me faz apaixonar e que, na minha opinião, tem a chave para o sucesso: baixo orçamento, bom guião e bons actores. Para além disso, é escrito e realizado por um jovem de 30 anos (feitos em Janeiro): Damien Chazelle.
Dizer que o filme é sobre jazz e músicos (como já li) era demasiado injusto. O filme é uma metáfora para a vida, contada através da história de Andrew Neiman (Miles Teller), um talentoso miúdo de 19 anos, que deseja tornar-se um baterista tão grandioso como o seu ídolo: Buddy Rich. Para realizar esse sonho, ingressa na melhor academia de música de Nova Iorque.
O seu talento é inegável e por isso Fletcher (J.K. Simmons), o mentor da banda de jazz que não compactua com nada inferior à perfeição e que se revela brutalmente exigente com os seus alunos, levando-os repetidamente aos seus limites físicos e psicológicos para que estes possam atingir o seu máximo potencial, recruta Andrew para baterista secundário, mas facilmente se percebe que o seu talento é demasiado grandioso para ficar à sombra.
Miles Teller e J.K. Simmons enchem o ecrã e são, para mim, uma grande surpresa. Acredito que Miles tem em Whiplash o papel que o vai catapultar para uma grande carreira porque tem um desempenho fantástico, com direito a lágrimas, suor e sangue de verdade (Miles Teller é um baterista autodidacta e a maioria das cenas foram mesmo gravadas com ele e o sangue é mesmo real). Nota-se o quão comprometido está com a sua personagem e a partir do primeiro minuto vê-se Miles florescer de uma forma incrível. J.K. Simmons é o actor secundário, mas dizer que é secundário é ser irrealista. O seu papel de vilão é magistralmente cumprido e apesar de ser uma personagem muito pouco amigável, é impossível não criar uma simpatia (antagónica) por ele. Fletcher representa a voz dos que nos puxam aos limites, muitas vezes de forma exagerada e absurda que nem parece real. Damien, o realizador, disse-lhe que não queria mais ver um ser humano no ecrã, queria ver um monstro, um gárgula, um animal.
 Whiplash é frenético do início ao fim, a edição é um espelho perfeito do jazz. Tem o tempo perfeito porque todas as cenas são essenciais e importantes (até os episódios do romance que é pouco explorado me parecem proeminentes para cortar a tensão que se vai sentindo ao longo de todo o filme). Apesar de já ter ouvido algumas críticas negativas relativamente ao final, eu acho que não podia acabar de outra forma porque percebemos que ambos conseguem atingir os seus sonhos e isso é a parte mais importante, é o ponto fulcral do filme.
Como disse antes, este filme é uma metáfora para a vida. É impossível alcançar a grandiosidade que todos procuramos (eu sou da opinião de que o ser humano é obcecado com a grandiosidade) sem sair da nossa zona de conforto, sem nos levarmos aos nossos limites, sem suor e lágrimas e sangue. Não se pode chegar a um destino diferente daquele onde nos encontramos se formos pelo mesmo caminho. É sobre isso que este filme é!

P.S.: Whiplash foi inicialmente apresentado como uma curta-metragem de 18 minutos no Sundance Film Festival em 2013 por falta de orçamento. Levou o prémio para casa e conseguiu um orçamento de 3,3 milhões de dólares, o orçamento mais baixo entre os nomeados (Boyhood - 4 milhões; The Imitation Game - 15 milhões; The Theory of Everything - 18 milhões; Birdman - 18 milhões; Selma - 20 milhões; The Grand Budapest Hotel - 30 milhões; American Sniper - 58,8 milhões). Foi filmado em apenas 19 dias e ficou pronto em sensivelmente 10 semanas. Tinha tudo para dar errado, mas deu tudo certo. 




terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

A minha estante | Prometo Falhar

Nome original: Prometo Falhar
Autor: Pedro Chagas Freitas
Editora: Marcador
Nrº de páginas: 390
Adoro que me ofereçam livros. Há qualquer magia inerte à oferta de um livro. Nunca se oferece só um livro, oferecem-se mundos paralelos e mundos novos para onde podemos viajar conforme a nossa vontade. Este "Prometo Falhar" estava na minha wishlist à algum tempo por diversos motivos: já tinha lido passagens do livro que me tinham agradado muito, também tinha lido coisas muito boas sobre o mesmo e, indubitavelmente, porque o autor é vimaranense. Foi-me oferecido por uma amiga muito especial, a minha partner in crime (obrigada Luiza, pela milésima vez!).
Não era o que esperava. É descrito como um romance mas não é, para mim, um romance. Este livro não conta uma história. Este livro é uma colectânea de crónicas essencialmente sobre amor. É um livro agradável porque tem várias passagens que, isoladas, são extremamente bonitas e uma fonte de inspiração. No entanto não é um livro para se ler seguido, pelo menos para mim. Torna-se repetitivo porque tem imensos lugares-comuns e pode tornar-se até um bocadinho chato. É um livro para se ir lendo, para abrir o livro numa página hoje e ler uma ou duas crónicas e para a semana fazer o mesmo. Talvez por as minhas expectativas estarem muito altas (está em todos os TOP de vendas) fiquei ligeiramente desiludida, achava que era uma obra-prima. Não é. É um livro agradável com o qual qualquer pessoa se pode identificar com uma ou com outra crónica, que a cada página pensamos "eu já quis dizer isto, mas não me consigo expressar assim". Tem passagens extremamente bonitas que dão uma vontade incontrolável de ler e reler e escrevê-las em algum lado para não sair da cabeça. No entanto tenta definir amor demasiadas vezes; e eu sou da opinião de que amor não se define, não é assim nem assado: dá-se e mostra-se amor, não se define, não é palpável ou visível.
Uma coisa que tem e que ninguém pode tirar é um valor sentimental incomparável; oferecer livros diz tanta coisa!

P.S.: Acho também que é um livro que, por ter uma escrita muito distinta, não é fácil. Eu sou uma amante incurável dos clássicos (os meus livros favoritos são "Anna Karénina" de Lev Tólstoi,"O Grande Gatsby" de Fitzgerald e companhias), são livros que exigem muita atenção e principalmente um esforço emocional como nenhum outro estilo literário. Talvez por isso este livro me tenha deixado à espera de mais que nunca chegou. Associo-o (e não sei se mais alguém para além de mim faz a mesma associação) a Margarida Rebelo Pinto da qual já fui uma leitora assídua e da qual não consigo pegar nos livros (pelo menos não neste momento). Margarida Rebelo Pinto diz, livro após livro, que os homens são uns trastes e que só o amor feminino pode curar esse lado desprezível que eles possuem; Pedro Chagas Freitas (do qual só conheço esta obra, mas estou decidida a ler outro dos seus livros para ver como é o estilo) fala sobre amor, amor e amor. Tenho só a dizer que gosto e admiro o estilo despreocupado e singular que o autor adopta, é arriscado mudar e ser diferente e Pedro é a todos os níveis: são diversos os estilos ao longo do livro e o próprio livro não é comum. Aconselho mas com moderação pelos motivos acima enumerados e acho (é só a minha opinião pessoal de leitora compulsiva) que deve ser lido aos bocados e de forma desordenada.